segunda-feira, 9 de março de 2015

Sobre Dias Das Mulheres

Então foi Dia Internacional Da Mulher ontem. Tudo muito lindo, várias flores, vamos todos dar as mãos e entoar um belo cântico e etc. Eu ia falar nesse post sobre a hipocrisia do amor (ahahha) e da igualdade (HAHAHA) durante o dia e os gritos de “piranha, vagabunda” pra presidenta durante a noite (gritos esses que tem o alvo a mulher por ser mulher, mas pra c e r t o s queridões no facebook não é machista. Claro que não. Pfff). Mas decidi falar de outra coisa, uma que vem me incomodando desde o dia 7, um diazinho só antes do Dia Da Mulher.

Dia 7 tinha tudo pra ser incrível – e, em grande parte, foi. Almocei no Outback com algumas das melhores pessoas do mundo, comi aquela costela deliciosa provavelmente humana e tive que correr pro banheiro pra fazer xixi depois do “jorra, Satã”. Mas antes disso acontecer, eu tive muito medo. Sim, medo. De quem? Um menino.

Eu tenho medo desse menino em especial já faz muito tempo. Sempre me senti perseguida e somehow invadida toda vez que ele estava por perto. Parecia que esse espirro do diabo estava em todos os lugares, era impossível escapar. A partir de um determinado momento ele começou a fazer comentários desnecessários e obviamente incômodos sobre os meus peitos. Sim, gente, meus peitos. E isso me deixava incomodada num nível absurdo (porque, né, não é muito bacana quando você ouve esse tipo de coisa), mas o máximo que eu conseguia fazer era a maior bitch face que o meu ascendente em capricórnio me permitia. Porque tinha/tenho medo das pessoas e sempre me senti muito inferior a elas.

Enfim, depois de muitos momentos horríveis em que eu tive vontade de tacar fogo em mim mesma,“me livrei” dele do melhor jeitinho eu: sendo quieta, disgusted face emoji colado no rosto e rolando os olhos.

Mas eis que o destino resolveu fazer graça de mim, e acabei por encontra-lo no shopping dia 7. Eu, literalmente, corri. Meus amigos vieram atrás, rindo da situação (eu também estava, porque foi de fato muito engraçado). Mas aí percebi que eu estava tremendo, suando frio e com medo. Medo de que? Dele. Que ele pudesse fazer alguma coisa comigo ou sei lá. Parando pra pensar agora, não tinha como aquele moleque fazer nada porque eu estava cercada de amigos, mas não consegui pensar nisso na hora porque tudo que eu sentia era medo. Só.

Essa, porém, não foi a pior parte.

Depois que terminamos de comer, nós íamos ao parque (e com “nós íamos ao parque” eu quero dizer Paulo e Érika indo nos brinquedos e o resto de nós olhando). Mas começou a chover e aí a gente desistiu. Só que, gente, não só choveu. CHOVEU. Em letras garrafais mesmo. Choveu tanto que, como eu expressei no meu Twitter, me senti como os animais não escolhidos por Noé no diluvio. Choveu tanto que, se alguém torcesse as minhas roupas depois que eu cheguei em casa, abastecia a Cantareira e acho que ainda sobrava um pouquinho.

Fazia tempo que eu não pegava uma chuva daquelas. Enquanto andava sozinha pelas ruas do Fonsequistão, pela segunda vez no dia eu tive muito medo. Não de ser assaltada ou pegar, sei lá, leptospirose por pisar naquela água límpida e pura. Esse medo é mais difícil de explicar.

Vamos voltar pra última vez em que eu peguei uma chuva como aquela. Faz algo em torno de 3 anos, eu ainda fazia curso de inglês (aliás, foi o último dia do curso). Tinha feito uma provinha oral, tínhamos todos trocado barras de chocolate. Tava tudo muito bem, tudo muito bom até que: um dos meus classmates insistiu em ir embora comigo. Achei estranho e tal, mas não me opus (até porque eu só aprendi a me opor às coisas bem recentemente, mas ainda preciso de prática). Não contente, ele insistiu também para que fossemos ao cinema e acho que o meu rosto virou um grande “????????”, mas óbvio que eu disse que não porque eu tinha acabado de voltar do centro, meus pés estavam sendo comidos pela sandália que eu estava usando ([one direction voice] STORY OF MY LIFE) e eu queria muito ir pra casa descansar. Mas o fuckboy continuou insistindo e, gente... Não me teste com isso de insistir. É um dos caminhos mais rápidos pra me deixar irritada.

Aí, mano. Mano. Ma-no. Começou a chover, mas choveu muito. MUITO. E eu tava com uma blusa meio branca, meio bege e, pra completar, não tinha nada nas mãos a não ser uma mísera folha A4. Eu, que já estava no ápice do desconforto, consegui ficar ainda mais desconfortável. Recordes sendo batidos, né nom?

Mas você acha que ia terminar assim? Claro que não. O menino fez um comentário sobre como “a minha blusa estava ficando transparente”. Ah, vale dizer que eu tinha 15 anos e ele tinha quase 20? Vale sim. Mano, eu respirei fundo e não disse nada. Comecei a andar rápido, o fuckboy segurou meu braço e disse “tá fugindo de mim, po?”. Olha, no desespero eu quase disse “queridão, to sim”.

Depois dessa exata frase, entrei em pânico. Eu só queria sair correndo dali o mais rápido possível, que ele ficasse bem atrás de mim num passado distante. Mas lembro de todos os detalhes, como se tivesse acontecido há 30 minutos e não há 3 anos. Ainda consigo sentir a minha respiração pesada, ambas as mãos em punhos e o meu coração batendo tão forte que eu achei que fosse explodir.

Ele tentou puxar mais assunto e eu simplesmente não conseguia mais responder, só sabia andar. Andar. Andar. Rápido. Rápido. Rápido. Mas o queridão tinha as pernas do tamanho da minha expectativa de vida, então não foi tarefa complicada acompanhar o meu passo.

Você acha que acabou? Não, não acabou. Tive que parar num sinal de trânsito. Sabe quando vêm uma situação e a sua cara fica meio “PUTA QUE PARIU ISSO SÓ PODER SER CARMA QUANTAS PESSOAS EU MATEI FALA PRA MIM DEUS QUANTAS OH CARALHO NÃO NAMORAL VAI TOMAR NO CU DEVEM TER AMARRADO MEU NOME NA BOCA DO SAPO MAIS FEDIDO DA PORRA DO BREJO NAMOR—“? Então.

Essa parte eu meio que não entendi até hoje. Ele foi se despedir de mim, parece, e disse algo como “eu gosto muito de você” (nesse momento veio um slide com uma fonte do WordArt com o filosófico dizer “Tá” na minha cabeça). E aí ele tentou me beijar. Várias vezes. Várias. Vezes. O cara meio que não pegou a dica de quando eu me esquivei? E tentou de novo? E eu esquivei outra vez? Põe essa cena em loop umas 10 vezes.

Aí eu fiz o que qualquer pessoa sensata faria, me taquei na frente dos carros e saí correndo. AINDA NÃO CONTENTE, o garoto foi atrás de mim. Mano, eu tava quase chorando no meio da rua. Que mais ele queria de mim, meu deus?

Ele começou a murmurar uns bagulhos que não entendi, eu só me lembro de dizer “eu só quero ir pra casa, por favor, eu só quero ir pra casa”. Então finalmente consegui ficar sozinha! Certo?

Certo. Mas quando eu estava prestes a nascer, deus olhou no fundo dos meus olhos e disse “nada na vida vai dar certo pra você, tá? Rapidão, só pra eu ver um negócio”. Tiro e queda, nada dá certo.

Enquanto eu praticamente nadava pra tentar chegar á casa, já com zero fucks given e com as sandálias na mão, passei em frente a um lugar com dois homens adultos na porta. Vamos recapitular o meu estado: completamente ensopada, com uma blusa bege, apenas uma folha A4 que eu segurava na frente dos meus peitos como se segurasse o destino da humanidade, (como já dito acima) sandálias na mão, olhos vermelhos e cheios de lágrimas, rosto vulnerável e cansado. Alvo tão fácil que parecia tutorial de jogo.

Antes de prosseguir, devo dizer que essa foi a parte que ocasionou o meu medo no dia 7. O Caso Fuckboy que contei acima foi só pra ilustrar o quão merda o dia já estava sendo e o quão vulnerável eu me encontrava na hora que o negócio aconteceu.

Eu estava sozinha, acabado de sair de qualquer que fosse aquela situação (seria legal um ponto de vista diferente do meu, mas eu acho que o cara estava usando ~técnicas abusivas~ comigo, pelo que ele disse e tal. Mas sei lá) e só queria ir pra minha casinha quente e seca.

Mas enfim, quando passei em frente ao lugar onde esses homens estavam, eu ouvi um “nossa, gatinha, você vai ficar doente, hein?” com um tom de voz tão inexplicavelmente nojento e... sei lá, não existe uma palavra na língua portuguesa que consiga definir como era. Acho que era mais como uma gosma verde-musgo que foi escorrendo da boca dele e se enroscando em mim até me sufocar. Foi bem esse o tom de voz.

Agora pausa, porque esse exato momento foi muito ?????????????. Vamos enumerar as perguntas.

1.       Qual a necessidade de dizer isso pra uma garota de 15 anos de idade ensopada e assustada?
2.       Desde quando um completo estranho se preocupa com o meu bem-estar e saúde? Desde nunca, o que nos leva à pergunta 3:
3.       O que ele pretendia conseguir com isso?

Esse momento fica na minha cabeça constantemente por conta dessas três perguntas. O objetivo era me fazer sentir como propriedade pública, onde todo mundo pode dar pitaco? Ou era para que eu ficasse ciente de que ele estava ali, observando? Olha, não sei.

O que eu sei é que, 3 anos depois, enquanto eu andava sozinha pelo temporal, eu senti medo. Não olhava pros lados, apertava tanto as chaves na minha mão que chegou a machucar e andava rápido – não pela chuva ou pela água cor de barro que sujava o meu tênis branquinho.

Tive medo de ouvir, de novo, um “nossa, gatinha, você vai ficar doente, hein?”. Tive medo de chegar à casa e me esconder, mais uma vez, debaixo do meu cobertor. Tive medo de, mais uma maldita vez, me sentir invadida, suja, como se o meu corpo fosse um objeto público que qualquer pessoa pudesse tecer comentários de qualquer sorte, porque não é como se objetos fossem se importar com alguma coisa.

E ainda tive que passar por um posto de gasolina. Sim, tenho uma história com um também, mas deixa isso pra outro post.


Então, cara, eu não quero as suas flores no 08 de março. Eu quero ser tratada como gente, não como objeto ou propriedade. Eu não quero as suas flores, porra, eu quero respeito.

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